sábado, 29 de dezembro de 2012

Em defesa do boi e do jumento


«Maria recostou o seu filho numa manjedoura» (Lucas 2, 7). 
Este breve trecho evangélico sugere ao Santo Padre, no seu último livro, uma série de reflexões que levam à meditação intertestamentária e, em particular, a Isaías 1, 3 – «O boi conhece o seu possuidor, e o jumento, o estábulo do seu dono, mas Israel nada conhece, o meu povo nada entende» – e a versão grega de Habacuc (3, 2): «No meio de dois seres vivos (…) tu serás conhecido, quando vier o tempo, tu aparecerás».  

Em relação a este último, Bento XVI, considerando os dois seres vivos como os querubins que apareceram sobre a arca da aliança, segundo Êxodo 25, 18-20, estabelece uma analogia entre a arca e a manjedoura, aquela na qual o Senhor foi posto e conhecido. Neste contexto, o boi e o jumento representam a humanidade inconsciente, que toma consciência diante do Menino, adquirindo o dom do conhecimento. Foi por isso que – conclui o Santo Padre – a iconografia cristã compreendeu este motivo, e que «nenhuma representação do presépio renuncia ao boi e ao jumento».

Se as primeiras alusões à profecia messiânica aparecem nas pinturas das catacumbas romanas já no século III, o tema do presépio, na sua totalidade, foi concebido numa oficina romana que, na primeira metade do século IV, produziu um relevo funerário, datado ad annum, em 343, mas infelizmente desaparecido. A partir daquele momento, a cena difundiu-se e – como se dizia – apresentava, como elementos fixos o boi e o jumento, a ponto que numa cena tardia de Bawit eles aparecem isolados, até sem o Menino, enquanto no hipogeu de Santa Maria in Stelle em Valpantena, nos arredores de Verona, eles estão ao lado da manjedoura, segundo um modelo que volta a ser representado, no final do século IV, na cobertura do sarcófago de Estilicão ou de Santo Ambrósio em Milão.

Uma das representações mais completas do presépio decora a cobertura do sarcófago de Boville Ernica, próximo de Frosinone. O relevo, que se refere aos anos centrais do século IV, mostra a cena da Natividade associada à da adoração dos magos. Os três reis indicam a estrela situada no tecto que cobre a manjedoura de palha, que contém o Menino em faixas, enquanto Maria, que apoia o rosto na mão direita em sinal de melancolia, está acompanhada por uma figura feminina, que abraça os joelhos com as mãos para indicar uma dor forte. Nesta figura, poderíamos reconhecer a parteira incrédula Salomé, referida nos escritos apócrifos da Infantia Salvatoris, ou seja o Proto-evangelho de Tiago e o Evangelho do Pseudo-Mateus. No relevo estão esculpidos o boi e o jumento e um personagem masculino, que pode ser identificado com um profeta, talvez Isaías ou Balaão, ou com um pastor.

   Fabrizio Bisconti

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